Se você parar por 10 segundos e
pensar no maior sonho da sua vida, que tipos de sentimentos dançariam em seu
coração? Eu fiz esse exercício com 16 anos de idade quando estive pela primeira
vez na cobertura de um hotel. Estava em Brasília e na ocasião fui declamar
poesias e cantar rap.
Mas você deve se perguntar o que esse conteúdo
ou indagação tem a ver com educação, digo com clareza: tudo! Deixe-me contar
uma história breve... Meu nome é Ribamar Felipe, muita gente me conhece como
Felipe Rima. Sou rapper, poeta, empreendedor e sobretudo um ser humano
“vivedor” que se permite viver intensamente cada momento da vida.
Venho de uma origem bem delicada. Nasci em
Fortaleza numa comunidade chamada Verdes Mares; ali, onde nasci e cresci, tive
poucas opções, poucas oportunidades para ser o que sou hoje e por isso agarrei
a primeira que tive.
Entre os 8 e 14 anos de idade tive acesso a
armas, percebi que minha família toda era envolvida com o crime, vi meus tios
serem assassinados, irmão preso, pai na dependência química e minha mãe lutando
como uma guerreira fazendo o equilíbrio das emoções.
Dentro dessa realidade eu passei a sonhar em
me tornar o traficante mais respeitado da zona leste de Fortaleza. Dentro da
cultura do crime na periferia eu acreditei no poder dos sonhos dessa forma; sei
que todo sonho pode se realizar e com certeza se eu tivesse seguido teria sido,
mesmo que isso custasse lágrimas e minha própria vida.
Com 14 anos de idade, recebi um convite de um
amigo de infância para ir a um projeto social; ele me anunciou que teria aulas
de grafite e logo me animei pelo fato da pichação estar bem próxima a mim. Ao
fazer as inscrições tive que escolher três oficinas, só assim poderia
participar do projeto, e assim fiz. Grafite, sexualidade e rap com
poesia.
Rap com poesia era a única que eu não queria, mas
fiz a inscrição mesmo assim. Logo nos primeiros encontros vivi várias
surpresas, mas a que mais comunicou meu coração foi quando na aula de rap a
professora propôs falar sobre poesia. Confesso que eu não me animei com isso,
me senti frustrado, enganado, afinal eu fui pelo grafite e falar de poesia não
era tão atraente aos meus olhos.
Fui criado numa família do crime, machismo
muito presente, intolerância e pessoas duras, insensíveis como referência;
claro que poesia seria a última coisa sobre o que eu gostaria de conversar.
Mesmo assim, a professora ganhou minha atenção, ela anunciou que iríamos falar
sobre Carlos Drummond de Andrade e recitou o poema que dizia:
“No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra
Nunca me esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
Tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra ”
Todas as vinte e cinco pessoas da roda de
conversa sorriram com esse aparentemente poema tão bobo. Mas eu fiquei em
choque! Pasmo! E pensando como esse cara escreveu uma poesia falando assim do
crack? Exatamente assim, eu pensei e senti a poesia ecoando dentro de mim
narrando meu momento mais delicado da vida, a dependência química do meu pai, a
função avassaladora do crack.
Com os olhos emocionados comentei com meu
amigo que aquilo era mágico, a poesia, a literatura acabara de chegar e me
conquistar sem porquê, nem pra quê.
Nesse mesmo dia, pela primeira vez eu fui à
biblioteca da escola por minha própria vontade, eu já havia ido outras vezes na
sala de multimeios, mas o fato de ter essa iniciativa já mudou minha percepção
e maneira de lidar com o mundo.
Por que eu estou contando essa história pra
você? Porque eu acredito no poder dos sonhos! Isso mesmo! Eu acredito, e você?
Agora imagina o poder dos sonhos somado ao poder do conhecimento e da educação?
Imaginou?
Continuando nossa história, aquela professora
que se chama Glória Diógenes me fez perceber a importância do papel do educador
para o mundo. Acredito que para ela naquele momento deve ter sido desafiador
levar poesia para jovens de favelas, para jovens duros e armados contra o
mundo, não com armas palpáveis, porém, com o olhar de quem foi educado para
estar armado frente ao mundo.
O educador, professor tem o papel de ser
conquistador, e conquistar não é fácil, porque exige naturalidade. Hoje imagino
quantos professores e professoras se intimidam ao pensar em levar poemas para
dentro da sala de aula, nesse mundo tão insensível. No entanto, os que superam
isto e acrescentam às suas aulas um vídeo motivacional, uma música, um rap,
ou uma poesia veem resultados grandiosos, pois oferecem reflexões e não apenas
respostas.
Os alunos em geral vão para a escola, para a
sala de aula, em busca de respostas para suas perguntas; então questiono
também: E se o professor não levasse respostas e fizesse apenas um dia de
perguntas? Seria desafiador? Acredito que sim!
Quando percebi que o conhecimento abre portas
eu me apaixonei por isso, passei a me dedicar a vários conteúdos que somavam
para a minha formação humana; eu fui no meu ritmo, buscando aquilo que me
interessava, me aproximando das pessoas que poderiam me ajudar e 50% delas
foram professores oriundos da academia (formados), outros 50% educadores da
vida, da rua, o que todos somos.
Sou fascinado pelo poder da educação. O
conhecimento compartilhado é uma das mais preciosas ferramentas desbravadoras
de caminhos do mundo. Reafirmo, sou encantado pelo poder dos sonhos. O sonho
revoluciona os corações e nos impulsiona na vida para alcançar o que parece
impossível.
Impossível! Eu gosto dessa palavra, ela é bem
desafiadora... Você acredita no impossível? Eu prefiro acreditar que tudo é
possível! Com oportunidades, trabalho em equipe, pessoas com sensibilidade para
lidar com a vida, com garra e determinação diante das pedras do caminho.
Perdoe-me, se meu texto segue na linha tênue,
entre o sonho e a educação, mas é que meu coração transborda de amor por esses
temas, várias vezes me perco e perco o fio da meada, me encontro nos devaneios
de ser feliz e me reconheço como um ser humano que anuncia perguntas, mesmo sem
pronunciá-las.
Agora que você conhece de onde eu venho,
deixe-me dizer como a força da educação tem me conduzido e por quais caminhos
tenho passeado nesse mar de sonhos. Depois do encontro com a poesia pude
vislumbrar novos horizontes e me atirei sem reservas na busca de uma vida
plena. Encontrei suporte com centenas de pessoas que me doaram seus
conhecimentos e me fizeram me reconhecer como Felipe Rima.
Percorri nos últimos quatro anos por sete
estados do Brasil e mais de cem cidades do meu Ceará. Nesse caminho, acredito
que de algum modo pude inspirar milhares de pessoas, inclusive chegar em Buenos
Aires, na Argentina, e poetizar a vida por lá. Mais que viajar por aí, tive a
oportunidade de viajar para dentro de mim até chegar aqui e através desse texto
me emocionar em saber que você está lendo, está tentando imaginar, sonhar e se
perguntando coisas novas.
Aos professores e às professoras do mundo
agradeço a dedicação e paciência ao exercerem a “profissão perigo”. Por fim,
gostaria de fazer um pedido a você: Elabore 10 perguntas para você responder,
se delicie em buscar essas respostas, mas não se preocupe em encontrá-las,
aprecie a viagem e grite para o mundo ouvir: EU ACREDITO NO PODER DOS SONHOS!
Felipe
Rima
Poeta, escritor, rapper,
palestrante e produtor cearense.